No limiar de um Ano Novo, ainda envolvidos pelas angústias, dificuldades e crises que marcam a nossa existência sobre a Terra, o nosso coração, como na situação descrita por Isaías, corre ao sentinela e pergunta: “Sentinela, o que dizes da noite? A quantas está a noite? O sentinela responde: chega o amanhecer, mas outra noite também. Se quiseres saber, volta a perguntar” (Is. 21, 1-12).
Como será o Novo Ano? — Perguntamo-nos. E ainda que façamos muitos planos, falta-nos a garantia de sua realização, face às incertezas do amanhã. Podemos comparar o novo ano com um caderno em branco que recebemos e que nele escreveremos com a nossa vida. Dependerá de como estaremos correspondendo ao plano de Deus para termos um ano feliz.
Desejamos a todos um feliz e próspero ano! Mas, muitas e muitas vezes, esta é uma expressão vazia, um abraço sem sentido. Apenas entra-se “na onda” úmida da embriaguez de uma euforia sem nexo.
O augúrio de paz deve brotar da sinceridade de nosso coração, arraigado na esperança de um esforço de toda a humanidade de levar à frente a construção e uma ordem social fundamentadas na justiça e expressas na caridade e no amor. Essas devem ser a razão de nossa alegria e da efusão dos nossos sentimentos, na maravilha dos fogos de artifício que iluminam a noite da passagem do ano, com o espocar dos foguetes misturados com os shows dos artistas.
Paulo VI, ao instituir o Dia Mundial da Paz em 1968, para marcar o primeiro dia do ano, desejava que “depois, a cada ano, esta celebração se viesse a repetir como augúrio e promessa no início do calendário que mede e traça o caminho da vida humana no tempo que seja a Paz, com o seu justo e benéfico equilíbrio, a dominar o processar-se da história no futuro".
A paz! Um grande dom que podemos aspirar para nossa vida, seja na intimidade de nossa alma, seja nas nossas atividades, seja para todo o mundo. Maravilhosa, na sua síntese e na expressão que abarca todo o anseio, a bênção divina que Moisés prescreveu para que por ela fôssemos enriquecidos na graça: “Que o Senhor te abençoe e te guarde, volte para ti a Sua face e te dê a paz”.
A paz é fruto de uma sociedade arquitetada na justiça e vivenciada no amor. São os parâmetros que o Senhor nos dá para vivermos na tranquilidade da ordem e no crescimento harmônico.
O homem é um ser livre e social. Por sua condição de um ser dotado de razão, tem a liberdade de escolher entre o Bem e o Mal, de pautar a vida e a sua atividade para dar continuidade à obra criadora de Deus, dominando a Terra e suas potencialidades para o crescimento e desenvolvimento de todos, como também, para num fechamento egoístico e mesmo irracional, desde que se garanta na sua sede insaciável do momento presente, tudo deixar à perdição, expoliando o direito alheio e gerando o ódio, a vingança e a miséria do outro.
Para que tenhamos a paz e a benção divina, cumpre-nos buscar a Verdade, não o conceito metafísico, mas, como nos ensina a Palavra de Deus na História da Salvação, numa vivência dela própria, na sua Luz que ilumina todo o homem que vem a este mundo e que crê que é filho de Deus. “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida”, disse Jesus, e “quem me segue não andará nas trevas”.
Lembremo-nos da profecia de Isaías lida, meditada e rezada neste Tempo Litúrigico. “O povo que caminhava nas trevas viu uma grande Luz”, e na continuidade nos descreve como são queimados no fogo os instrumentos de guerra, as botas dos opressores, porque um Filho nos foi dado e nele a Luz da Verdade, o Verbo Eterno.
O Papa Bento XVI, para o ano de 2012, envia a sua mensagem para esse dia que tem como tema central: “Educar os jovens para a Verdade e a Paz”. Oportuna a manifestação do Sumo Pontífice, porque a juventude valoriza as pessoas autênticas e verdadeiras, e somente acorrem a atividades crivéis, de quem vive, primeiro, o que prega. Ensina, em sua alocução, o Papa: “Mas, nesta escuridão, o coração do homem não cessa de aguardar pela aurora de que fala o salmista. Esta expectativa mostra-se particularmente viva e visível nos jovens; e é por isso que o meu pensamento se volta para eles, considerando o contributo que podem e devem oferecer à sociedade. Queria, pois, revestir a Mensagem para o XLV Dia Mundial da Paz duma perspectiva educativa: « Educar os jovens para a justiça e a paz », convencido de que eles podem, com o seu entusiasmo e idealismo, oferecer uma nova esperança ao mundo. A minha Mensagem dirige-se também aos pais, às famílias, a todas as componentes educativas, formadoras, bem como aos responsáveis nos diversos âmbitos da vida religiosa, social, política, econômica, cultural e mediática. “Prestar atenção ao mundo juvenil, saber escutá-lo e valorizá-lo para a construção dum futuro de justiça e de paz não é só uma oportunidade, mas um dever primário de toda a sociedade”.
Bento XVI nos convida a valorizar a vida em todas as suas dimensões: “Trata-se de comunicar aos jovens o apreço pelo valor positivo da vida, suscitando neles o desejo de consumá-la ao serviço do Bem. Esta é uma tarefa na qual todos nós estamos, pessoalmente, comprometidos”.
Logo depois da JMJ Madrid 2011, em que o Papa Bento XVI esteve em contato mais próximo com mais de dois milhões de jovens, ele constata: “As preocupações manifestadas por muitos jovens nestes últimos tempos, em várias regiões do mundo, exprimem o desejo de poder olhar para o futuro com fundada esperança. Na hora atual, muitos são os aspectos que os trazem apreensivos: o desejo de receber uma formação que os prepare de maneira mais profunda para enfrentar a realidade, a dificuldade de formar uma família e encontrar um emprego estável, a capacidade efetiva de intervir no mundo da política, da cultura e da economia, contribuindo para a construção duma sociedade de rosto mais humano e solidário. É importante que estes fermentos e o idealismo que encerram encontrem a devida atenção em todas os componentes da sociedade. A Igreja olha para os jovens com esperança, tem confiança neles e encoraja-os a procurarem a verdade, a defenderem o bem comum, a possuírem perspectivas abertas sobre o mundo e olhos capazes de ver « coisas novas » (Is 42, 9; 48, 6).
Ao iniciar o ano de 2012, olhando para Maria Santíssima, a Rainha da Paz, façamos força pessoal e coletiva para que a Justiça e o Amor sejam para todos, particularmente para os jovens brasileiros que se preparam para a JMJ Rio 2013, consequência de quem, com o coração aberto à mensagem de Cristo, trilha o Caminho da Verdade, que dá a vida, que vence o horror da morte.
Em nosso íntimo, encontramos a paz se procurarmos viver a Verdade no Amor e na Justiça, numa integridade sadia de respeito a nós mesmos, ao nosso corpo e às nossas potências vitais que temos dentro de nós, de crescermos em sabedoria e graça, buscando a perfeição a que fomos chamados: “sede perfeitos como vosso Pai Celestial é perfeito”.
Encontraremos também a paz em nosso meio, na família, na sociedade, se nossos pés forem de pessoas anunciadoras da paz, não só no simples desejo ou nos votos de felicidades para o Novo Ano, por mais belo que seja o cartão, por mais bela que seja a mensagem, mas principalmente através de atitudes concretas de vida.
Trabalhemos para que o abençoado ano de 2012 seja feliz e comprometido com a vida nova de justiça e paz.
Dom Orani Jõao Tempesta - Arcebispo Metropolitano
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